28 de ago. de 2013

28/08/13

IV
          
         Nos breves momentos que sucedem o constrangimento sentido quando noto na fala de alguém convicções com data de validade a expirar sendo apresentadas como verdades universais em tom excessivo, cerro meus olhos para não ser cego por tanto brilho, ouvidos seletivos filtram a retórica do discurso, ensaio um sorriso de fachada e diplomaticamente ouço com as mãos nos bolsos ou senão com os dedos todos a estalar um por um, olho para o locutor, pisco lentamente mantendo meus olhos fechados pelo dobro do tempo necessário e não digo nada.

      Claro que não sou Buda e julgo e mordo a língua discretamente até sangrar com cara impassível ainda sorrindo sem mostrar os dentes, mas depois de anos pedindo desculpas e desdizendo coisas de ímpeto e da boca do momento, hoje prefiro respostas monossilábicas com entonação natural, com cuidado para não parecer arrogante, pois atitudes arrogantes sempre causam antagonismo e precedem justificativas.


     O telefone havia tocado e agora você fala e diz e acha que estou perdido -usando o máximo de palavras, mas é da boca pra fora então eu relevo e lembro que você não bebe café pois te agita- foi a minha leitura resumida da ligação na qual fiquei cinco minutos ouvindo o que sente e pensa e tudo que eu disse foi sim, compreendo, arram e oquêi nos silêncios que você usava para respirar. Enquanto eu refletia calado sobre de onde viria conselho opinião expectativa embalado com receio e hipótese vulgar, eu era distraído pelas conjecturas que a mente cria e sua boca teima em dizer.